Nos últimos anos, a saúde mental ganhou espaço nas conversas do dia a dia, nas redes sociais e até nas pautas corporativas. Mas, apesar da maior visibilidade, os números mostram uma realidade preocupante: nunca se afastou tanto do trabalho por motivos relacionados à ansiedade e à depressão quanto agora. O Brasil enfrenta uma verdadeira epidemia silenciosa de adoecimento emocional — e a principal causa disso é a sobrecarga prolongada, que afeta milhões de pessoas diariamente.
A escalada de afastamentos por transtornos mentais no Brasil
De acordo com dados recentes do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), divulgados nesta reportagem do G1, o número de afastamentos por transtornos mentais e comportamentais atingiu o maior patamar da última década. Em 2023, mais de 288 mil pessoas precisaram se afastar do trabalho devido a quadros como ansiedade, depressão e síndrome de burnout.
Esse aumento está diretamente relacionado ao ritmo exaustivo da vida moderna. A pressão constante por produtividade, o acúmulo de tarefas, a falta de pausas e o desequilíbrio entre vida pessoal e profissional formam um cenário de estresse crônico — gatilho comum para diversos transtornos mentais.
O que acontece com o corpo e a mente sob sobrecarga constante?
A sobrecarga mental não surge de uma hora para outra. Ela se desenvolve de forma gradual, muitas vezes imperceptível, até que os sintomas começam a comprometer o dia a dia. Entre os principais sinais estão:
- Cansaço excessivo mesmo após repouso;
- Irritabilidade e alterações de humor;
- Falhas de memória e dificuldade de concentração;
- Insônia ou sono não reparador;
- Sentimentos de incapacidade ou desesperança;
- Crises de ansiedade e sintomas físicos, como dores de cabeça, taquicardia e problemas digestivos.
Quando o corpo e a mente operam sob pressão constante, o sistema nervoso entra em estado de alerta permanente. Isso aumenta os níveis de cortisol (o hormônio do estresse) e prejudica diversas funções fisiológicas, favorecendo o aparecimento de doenças físicas e mentais.
Burnout: quando o esgotamento se torna doença
A Síndrome de Burnout é um dos diagnósticos mais associados à sobrecarga prolongada. Reconhecida pela Organização Mundial da Saúde (OMS) como um fenômeno ocupacional, essa condição é resultado de um estresse crônico relacionado ao trabalho que não foi adequadamente gerenciado.
Pessoas com burnout se sentem emocionalmente esgotadas, perdem o entusiasmo pelo trabalho e passam a apresentar baixa produtividade. O problema é que, sem o devido cuidado, esse quadro pode evoluir para depressão severa ou outros transtornos incapacitantes.
A cultura da produtividade tóxica e o impacto na saúde mental
Muitos ambientes profissionais ainda reforçam a ideia de que é preciso “dar conta de tudo”, “trabalhar até tarde” e “não demonstrar fraqueza”. Essa cultura da produtividade tóxica alimenta a sobrecarga emocional, faz com que as pessoas ignorem seus próprios limites e dificultam o pedido de ajuda.
Além disso, com o avanço da tecnologia e do home office, as fronteiras entre trabalho e vida pessoal se tornaram cada vez mais difusas. Estar constantemente conectado e disponível pode parecer um diferencial competitivo, mas, na prática, contribui para o esgotamento mental.
Populações mais afetadas pela sobrecarga emocional
Embora a sobrecarga mental possa atingir qualquer pessoa, alguns grupos apresentam maior vulnerabilidade. Segundo especialistas, as mulheres são as mais afetadas, principalmente por acumularem múltiplas jornadas — trabalho, cuidados com a casa, filhos e, muitas vezes, familiares doentes ou idosos.
Profissionais da saúde, professores, motoristas, atendentes e pessoas que atuam com público sob pressão constante também estão entre os que mais adoecem. Nessas profissões, a exigência emocional é alta, e o suporte psicológico muitas vezes é escasso.
Como prevenir os efeitos da sobrecarga mental
Cuidar da saúde mental não é um luxo, mas uma necessidade básica. A boa notícia é que algumas atitudes simples podem ajudar a prevenir os efeitos da sobrecarga emocional. Veja algumas estratégias recomendadas por especialistas:
1. Estabeleça limites
Aprender a dizer “não” é fundamental. Delimite horários para o trabalho e respeite seu tempo de descanso. Evite levar demandas profissionais para os fins de semana ou períodos de lazer.
2. Faça pausas durante o dia
Micro-pausas ao longo do expediente ajudam a reduzir a tensão e melhoram a produtividade. Levante-se da cadeira, respire fundo, alongue-se ou tome um café sem checar e-mails ou mensagens.
3. Priorize o sono e a alimentação
Dormir bem e manter uma alimentação equilibrada são pilares da saúde mental. O sono reparador ajuda o cérebro a processar emoções e enfrentar o dia seguinte com mais clareza.
4. Pratique atividades físicas
O exercício físico libera endorfinas, que promovem sensação de bem-estar e reduzem os níveis de estresse. Caminhadas, yoga, dança ou qualquer movimento regular já fazem diferença.
5. Busque apoio psicológico
Terapia não é só para quem está em crise. O acompanhamento psicológico pode ajudar na prevenção de transtornos, no autoconhecimento e na construção de estratégias para lidar com a sobrecarga.
O papel das empresas no cuidado com a saúde mental
Empresas que investem em saúde mental colhem benefícios diretos: menos afastamentos, mais engajamento e um ambiente mais saudável. Criar políticas de bem-estar, promover diálogo aberto sobre o tema e oferecer suporte psicológico são atitudes que podem mudar o rumo da saúde dos colaboradores.
Além disso, líderes e gestores têm papel crucial nesse processo. Quando reconhecem os sinais de sobrecarga nas equipes e incentivam hábitos saudáveis, contribuem para a construção de uma cultura organizacional mais humana.
Quando procurar ajuda profissional?
Se os sintomas de esgotamento persistem por semanas, se há sofrimento emocional intenso ou prejuízos no trabalho, nos estudos ou nos relacionamentos, é hora de procurar ajuda profissional. Psicólogos, psiquiatras e terapeutas ocupacionais são aliados importantes no processo de recuperação da saúde mental.
Vale lembrar que transtornos como depressão e ansiedade têm tratamento e, quanto antes forem diagnosticados, maiores as chances de recuperação e qualidade de vida.